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Poema do Vocabulário 001 – Gavinhas

Pentear os cabelos,
para sair no vento.
Todos os dias.
A vida basicamente é isso.
Vento e desarranjo.
Nada para no lugar.
Nem o lugar fica no lugar.
Folhas soltas não tem gavinhas*.
Tudo é folha solta no vento.
*Gavinha: órgão vegetal através do qual algumas plantas se ligam a outras ou se fixam àquilo que as rodeiam.

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Escritos de Dor

Não há serenidade nenhuma. Só sinto um outro algo. Uma eterna perturbação dolorida, um desassossego crônico, pontiagudo, um rumor subterrâneo e lacrimoso por trás da alma, um marulho angustiado, apertado, tenso, assustado, bem no meio do peito. A sensação da despedida em mil portos e rodoviárias, quando o ônibus vira a esquina devagar ou o barco se perde no infinito, como se a gente fosse um lugar para o qual ninguém volta, como se a gente fosse um tempo que sempre já passou e toda alma já esqueceu. Assim como que um vazio desabrigado que ninguém vem socorrer, uma dor que ninguém vem acalmar. É um desespero despertencido de se estar deslocado sem nunca ter sido realmente colocado de verdade em lugar nenhum. O desamparo órfão de se não estar em lugar algum, como que sempre vagando invisível por uma cidade fantasma, eternamente, tudo é fantasma. É assim como que um vento escuro que atravessa os ossos da gente a toda hora, não há descanso, nem trégua, só um medo frio, gelado, agitado, na medula, que não sossega nunca, que não acalma, que não alivia. Uma represa de choro entre os seios, onde devia estar o coração, mas é uma água triste ali, encolhida, apavorada, como espinho aninhado na carne, um (more…)

E se de repente pára?

~Deitada, quieta, no escuro, o coração bate tão forte que se faz sentir.
E se de repente para?
Um musculinho de nada, batendo teimoso, por décadas. E se de repente para? Essa maquininha, por que funciona?
Uma bolota de carne, caída no mundo, sem manual. Ciente de que existe. Para que? Vá você dizer com certeza o que está fazendo aqui, por quê isso eu não tenho para dizer. Estou aqui. Estou fazendo, mas o que?
Estou só pulsando. Só? Estou só. Na verdade nem isso. Eu só estou. Estou. Estou esse corpo, essa massinha de carne, com esse negocinho que pulsa.
E se de repente para?
Que pode ele diante do vendaval que assopra, da faca que fura, da terra que (more…)